terça-feira, 29 de abril de 2014

OSVALDO

Se não fosse o bar,
A mesa, essa mulher e a noite fria,
Que seria, Osvaldo, conta, do teu dia?

Se não fosse a noite,
O bar, essa mulher e a mesa fria,
Quanta tristeza, Osvaldo, tu ruminarias?

Se não fosse a mesa,
O bar, a noite e a mulher fria,
Quanto desejo de morrer tu sentirias?

Se não  fosse o porre,
O fumo, o som e tanta orgia,
A tua alma qual bem é tu bem verias.

Se não fosse a dança,
Essa lascívia e as moças libertinas,
Como a ti, meu caro, tu suportarias?

Se não fosse a esbórnia,
Os peitos, coxas, o fetiche, a fantasia,
O quão solitário agora tu te encontrarias?

Se a realidade
Parecesse doce ao teu palato, à tua língua,
Na bandida noite, eu sei, não estarias.

Barão da Mata

Um Futuro Ser Completo



Um Futuro Ser Completo
(9/3/10)

Saber viver - saber esperar
Tudo na contramão da situação.
Montar no mundo e cavalgar,
Largar o cogente por só querer.

Se o tempo é sua Nêmesis
Levante e corra em qualquer direção;
Saia do ostracismo de um abrigo
Pois essa saída é enganação.

No adjunto de tudo que te faz feliz
Vale a pena o tempo perdido;
Se por um lado desce ralo abaixo,
Por outro alimenta sua alma.

Com sabedoria e muita calma
O mundo estará em suas mãos;
Com paz, integridade e humildade
Tornar-se-á muito mais do que aprendiz.

Ser um monge na pura meditação
Que paira o silêncio ao se encontrar,
Passeando ao redor do espaço tempo
Sem sequer ter hora para chegar.

(versa e vice)
Totalmente de bem com sua vida
Sabiamente convida ao vivo o bem,
Com sua mente muito bem na vida sã
Para conviver sabiamente com sua vida zen.


André Anlub®

segunda-feira, 28 de abril de 2014

VELEIRO...




Vou viajar...
Velejar entre os mares,
Colocar os pés nos portos,
Cheirar os peixes,
Beijar as gaivotas.
Direi adeus às lembranças,
Mas serei feliz.


Vou viajar...
Fazer grandes malas.
Voarei pelas janelas da sala
Pra conseguir pousar nos cais.


Vou viajar...
Brincar de fada,
Subir na montanha encantada
E, no vulcão, mergulharei minhas mãos.


Vou viajar...
Pelo sideral,
Pelo infinito,
Em sonhos astrais...
E, na minha viagem,
Deixarei cair meu ser carente
Sobre teu ser,
Nessa viagem
Que hei de fazer...


Malu Silva



quinta-feira, 24 de abril de 2014

LOBATO

Conheci Lobato quando eu tinha ainda meus quinze anos. Morava na Penha.  Devia já estar ele pelos seus sessenta a sessenta e cinco anos. Era culto e tinha voz firme. Cabeça branca, magro, enrugado, irônico, irreverente, beberrão, envelhecido e sempre com trajes sujos e velhos, vivia pelos botequins e dormia nas ruas, sobrevivia de alguns biscates e de desenhar Jesus Cristo no chão, com carvão, em troca de moedas que lhe jogavam. Era despojado de tudo.  Diziam que sua família tinha boa condição social e vez por outra o recolhia, dava-lhe boas roupas e uma vida condigna, mas sempre o velho voltava às ruas. Era a vida de que gostava.   
Eu o admirava, porque, apesar da pouca idade, via nele algo novo, totalmente fora dos padrões que eu conhecia, uma espécie de repúdio ao bom-mocismo tão hipocritamente professado pelas pessoas e a sociedade em geral.  E justamente naquela época eu já começava a renegar a figura do bom-moço, do bem-ajustado às ideias dos pais "perfeitos"  e cheios de princípios morais pouco sinceros e muito duvidosos.  Lobato  era o desprendimento, a desambição e talvez me tenha exercido alguma influência. Possivelmente porque me lembrasse, guardadas as devidas proporções, Diógenes, o filósofo grego totalmente desapegado das convenções sociais e cujos únicos bens eram um tonel que usava para abrigar-se do frio e uma cuia com que bebia água, a qual jogou fora após ver um menino fazê-lo convertendo as mãos uma concha. As histórias que me eram contadas do pensador me fascinavam Talvez o indigente misturasse Diógenes com Jesuíno Galo Doido, o anárquico velho vagabundo de "Os Pastores da Noite", de Jorge Amado ( não conhecida ainda eu o Quincas Berro D´´Agua). 
Não sei o exato motivo: só sei que me encantou, porque eu estudava à tarde e, embora ainda não bebesse, passava as manhãs sentado a mesas de botequins, só para ouvi-lo contar suas histórias e ficar a conversar com ele.  Um dia me contou que na juventude fora militar e, num baile do pessoal das forças armadas, dançara com a mulher de um oficial superior, com quem flertara durante a dança. Soube (ele) que depois, manifestado o ciúme do marido, a moça confessara  acintosamente que gostara do comandado: por isto, o oficial teria conseguido um pretexto para desempregá-lo.  
Não contava do que teria vivido antes de optar pela mendicância... ou se ter-se-ia entregado à indigência lopo após o episódio.  Mas o fato é que gostava de andar com roupas sujas e velhas e de viver dos expedientes de que já falei.
Vez por outra sumia.  Quando se perguntava pelo velho, diziam que havia morrido. Passavam-se dois ou três meses, reaparecia.
- Lobato, mas disseram que você...
- Que eu tinha morrido, eu sei.
Brincalhão e divertido, outros jovens gostavam de ficar em torno dele.  Os mais maduros gostavam de ocupá-lo para confabulações mais sérias e mais cultas.
Sumiu duas, três vezes, e voltou sempre se dizendo sabedor do boato de que morrera.  Uma vez desapareceu e nunca mais voltou. Uns quinze anos mais tarde alguém me contou  que realmente morrera: resolvera integrar-se à sociedade, fora morar com a família, arranjara um emprego de motorista e morreu num acidente de  automóvel.
O nome do homem não é fictício, era este realmente culto, irreverente e respeitado pelos que também o eram(cultos), vivia embriagado e ganhava a vida com desenhos no chão e biscates, mas todas as outras histórias soube através dele próprio e das pessoas que o rodeavam. Até a morte soube por intermédio de um conhecido comum.  Mas que era um homem fascinante, inegavelmente era.

Barão da Mata  

CANTA

Canta vibrantemente como guerreiro enfurecido.
Solta a voz com toda a força da alma intensa, ensandecida,
Espalhando milhões de emoções ardentes pelo ar.

Canta, minha cantora... canta com a gana de quem ama,
De quem goza, quem odeia, de quem sofre enormemente.
Canta lindamente como um coral de passarinhos
Num iluminado, colorido, ensolarado amanhecer.

Canta, minha cantora, e me leva em tua voz
A todos os sentimentos que brotarem do teu peito fogueado,
Numa viagem encantada e banhada em delírio
[ e poesia.




Barão da Mata

quarta-feira, 23 de abril de 2014

ÁGUAS DA PRIMAVERA...


Depois de anos, as cigarras saem do fundo da terra e cantam a melodia que, com a morte, se encerra.
Explodem em canções quentes que voam pelo ar em fios transcendentes...
As asas soltas, libertas da vida contida,
O som guardado em caixinhas de veludo, revestidas.
E, a formiga, sua amiga, pára a escutar o concerto efêmero.
Entre a seiva das árvores tecem a consonância do Universo.
Formigas cortam folhas e roubam sementes de outras lavouras...
Cigarras voam... e cantando inundam de luz o silêncio.
A sinfonia da Vida é ouvida por aqueles que mergulham no imperceptível,
No invisível horizonte perdido à frente
E que, por um momento, afundam nas águas transparentes da Primavera.

Malu Silva




Os tantos meninos poetas


A espada é erguida
em alguns pontos do planeta.
Logo em seguida
derrama-se a tinta
da lança chamada caneta.

Os tantos meninos poetas
(18/7/13)

E cá voltou de outra época longínqua,
O apoucado moleque descalço.
Veio de um cataclísmico berço esplêndido,
Nos revides eternos do vil encalço.

Retorna a salvo, mas a mente vazia de ideias,
Na bagagem traz a insatisfação.
Menino louco de pessimismo confuso,
E demasiadamente obtuso coração.

Viu a total desgraça de uma raça,
Viu veemência e no caráter a falência.
Lutou com moços na frente de batalha,
Ofuscou-se com o brilho da navalha da realeza.

Do futuro o menino prodígio poeta,
Com bolsos cheios de gritos de guerra.

Suas bandeiras: cantigas de amor e saudade...
São suas trincheiras contra o algoz da realidade.

André Anlub®

terça-feira, 22 de abril de 2014

Variações Acerca da Ilusão


Variações Acerca da Ilusão

A casa onde mora ilusão
não é um buraco no vão
um argumento destituído
inconsistente e diluído

Não tem no juízo a razão
desconhecimento empírico
sem estatuto científico
desejo de pura expressão

Ilusão tem a cara de musa
de natureza doce e confusa
e insinua a real fantasia

É a mãe do fogo da criação
tem como amiga a inspiração
habita o reino da poesia.

Wasil Sacharuk

PEQUENA CIDADE DE MINAS

A terra
fresca
e o seu cheiro bom de vida.
Suor
dos homens
e os anseios das mulheres.

As mãos 
de fêmea
salpicando a terra escura
de amor,
sementes
e de sonhos de futuro.

Os homens,
gozo
e a vida se plantando
em noites
calmas, 
nas entranhas das mulheres.

Manhã,
os sinos,
os fiéis e a ladainha.

O sol, 
a praça,
as crianças, brincadeiras.

A gente,
as vozes,
multidão que acende o dia.

Mocinhas 
belas
e seus sonhos tão românticos.

Ah, Deus!
Mas como é belo o dia!
Como é bela a rua, a gente
e esse verde exuberante
e tão vivo desses campos!
Como tudo é, Deus, tão belo!
Salve, Deus, Minas Gerais! 

Barão da Mata



LINDAURA, A FILHA DA TERRA

Lindaura era filha da terrra,
Ou mais, era bicho da terra,
Era coisa da terra, assim como arara,
Assim como as lendas, assim como as onças,
Assim como as antas, jacus, gaviões.

Lindaura, mulher de família, 
Colhia castanhas, mãos dadas co'a mata,
Criava seus filhos, amava o marido,
Amava esta vida, na paz mais completa.

Lindaura, porém, jamais esperara,
Que um monte de bestas, com foices e serras,
Com armas em punho e seus olhos de monstro,
Fizesse da mata um paiol de madeira.
Matassem as onças, jacus, gaviões,
Matassem seu homem, roubassem-lhe a terra,
A paz, a alegria, projetos e sonhos.

Lindaura, sem terra e sustento,
Desceu lá do norte, fincou pé no Rio,
Depois das agruras e mil provações
Vividas em tantas cidades distintas,
Depois de ser tudo o que nunca pensara:
Meretriz e mendiga, faxineira também.

Lindaura, hoje em dia, tão longe da terra,
Do lixo das ruas que ganha seu pão.
Tem dores no corpo, saudades doídas,
Dois filhos no crime, um morto de dengue.
Menor de cinquenta, parece tão velha,
Desejos, se tem, são todos de morte,
Se tem esperança, é o rumo do tempo,
Que um dia a irá suprimir deste mundo.

Barão da Mata

Minha Órbita



Minha Órbita

Pensei que fosse a lua cheia
a amiga fiel, a companheira
Ou então a estrela brilhante
encravada no céu rutilante
Pensei que fosse Saturno
com seus aneis, destroços crueis
Pensei que fosse Júpiter
Tão grande e majestoso,
secretamente ardoroso
Pensei ainda que fosse Marte
tão vasto na arte,
tão sublime, tão plástico
Pensei até que fosse o sol...

Mas era só um cometa
insano e destrutivo
que me deixou atrevida
confusa e bandida
e depois sumiu no horizonte
não percebeu o desastre
invadiu minha órbita
lançou-me no buraco negro
e sequer saiu da rota.

Dhenova


www.dhenova.com

segunda-feira, 21 de abril de 2014

PERDOE-ME

Perdoe-me versejar
assim plangentemente,
perdoe-me poetar
tão lastimosamente...

Mas que posso fazer, se a música cessou
e a bailarina já se sentou
exaurida e desolada
a um canto do teatro
silente e já vazio?

Perdoe-me cantar
de modo tão sentido!
Pedoe-me recitar
assim tão tristemente!

Mas que posso fazer, se anoiteceu
profundamente,
se a última mulher
se despediu,
deixando a noite co'esse gosto
de solidão?

Que posso fazer, se nenhum riso
ou burburinho,
se nenhum canto,
se nenhum passo
na noite escura
se fez ouvir?

Que posso fazer, se o cais, sem vida,
não tem a lua
a pratear,
não tem estrelas
a cintilar
e nenhum barco
a balançar?

Bar/ao da Mata




A DANÇARINA

Se a poesia brotasse
De repente
Em plena Rio Branco,
Na forma de uma bailarina
Que dançasse lascivamente enquanto
Se despisse por inteiro,
Dando ao vento os sete véus,

Seria preciso
Desviar o trânsito e recolher
Ao xadrez os transeuntes,
Por serem torpes e perversos
E por isto
Atentarem ao pudor.

Seria preciso chamar os libertinos,
Os palhaços, os circenses,
Os irreverentes
E os cantores loucos
Pr'eles isolarem num cordão humano
A encantada moça,
Que assim poderia,
Pura, sublime,
Saltitar em paz.


Barão da Mata

MISSA

E aquela oração que se ouvia
Fez que nascesse a esperança
No peito daquela gente
Que muito orava e pedia
E de inda mais carecia,
Mas não sabia do rumo,
Da direção a seguir.

E aquelas palavras de alento
Faziam brilhar os olhos
Daquele povo que achava
Viria um dia a justiça
- Depois da morte ou na vida -
E tudo deixava por conta
Da providência divina.

E aquelas histórias da Bíblia
Enchiam de luz os rostos
Daquelas pessoas sem norte
Que achavam que toda mazela
Era destino traçado
Pelo Senhor, que escrevia
Correto por linhas tortas.

E aquela massa cantava,
Rezava rosários e terços,
Ao fim da missa partia
Segura do próprio triunfo,
Das suas futuras conquistas,
De ter-se valido dos meios
Mais certos pra sua luta,
De ter cumprido o dever.

Barão da Mata

O Amanhã que Grita


O Amanhã que grita.

Fechando e abrindo os olhos pálidos para um adeus tardio.
Cercada pela lua de mercúrio acorrentada em seu tornozelos.
Sobre a proa queima seus ossos como estrelas que nascem.
Abrindo as cortinas da escuridão atrás de um novo amanhã,
Quando apenas podemos ver restos dos fantasmas que descansam,
Quando apenas podemos observar verdadeiro heróis
através dos olhos da miséria e da desolação,
Repousam sobre as brumas e são submersos pelas ondas.

Com a sua mão estendida abanando para ao amanhã que grita.
E o teu ouvido triste ressonante e lamentável
ouve esta canção tonitruante,
E as paredes noturnas tortuosas caem nos vales,
soando distante como as nuvens.
E lá cada lágrima irrompe pela garganta
através das manhãs que choram.

Bem, não é preciso muito para chegar a algum lugar,
Não é preciso um mar ou uma lua para ser banhado,
 Ou lábio macio e doce dizendo é hora de partir.
Não, há porque conter suas lágrimas ou risos,
A única parede a despir e da sua própria casa.
Preocupando em nascer em si próprio,
Mais do que morrer em seu limite.

Eu conheço a oração do bardo louco perdido na tempestade.
E mesmo que atravesse esse continente ele não me ouvirá,
E mesmo que eu traga o meu soldado de botas flutuantes não serei atendido.
Ainda tendo a minha oração ardente queimado no caminho do esquecimento.
E um copo de vinho e sangue se misturam,
Há corpo em chamas em cada grão de areia derramados sob o luar,
e um beijo breve, sedento e dócil em cada esquina.
Há ainda um caminho no meio das águas turvas do oceano
ou na escuridão profunda de cada cela?
Para cada alma em declínio ou para cada amante em silêncio secreto. 
Para as nossas almas torturadas liberta-se, a procura da salvação.

POEMA DE NÃO-AMOR

Quero fazer um poema que seja só não-amor.
Que não seja canto, mas silêncio;
que não seja perdão, mas ódio
calado,
velado
e mudo.


Quero fazer um poema que não olhe nos olhos da amada,
mas baixe a fronte,
jogando os próprios olhos
sem brilho
no chão.


Quero fazer um poema cheio de vazio,
que não afague,
mas ponha as mãos
cerradas
para trás.


Quero fazer um poema que nada expresse,
não faça gesto,
não olhe,
não sinta,
mantenha a boca
fechada,
trancada,
e o corpo
imóvel
tal como estátua
fe
ita de pedra.


Barão da Mata

VERSOS DE PORCELANA Nº 2

Quero te fazer um poema co’a delicadeza de quem toca harpa,
Co’a mansidão de quem dedilha violão.
Quero versejar para ti assim como quem toca flauta,
Como quem docemente canta ao silêncio da profunda noite.
Quero te cantar como quem se dá de todo às estrelas e ao luar,
Numa coisa assim que é mais que prece, que oração, que reza,
Mais que entrega, enlevamento, que viagem,
Algo que nenhuma língua tem palavras para exprimir.

domingo, 20 de abril de 2014

Vale dos sonhos

 Foto: Camila Domingues / Palácio Piratini


Vale dos sonhos

Descobri meu vale dos sonhos
na tarde de sexta-feira
num cochilo na cadeira
sonhei com olhos risonhos

seus traços de princesa
cabelos negros em espirais
herdeira do amor de seus pais
a sucessora da realeza

no vale havia uma aldeia
no centro do bosque encantado
onde a sorte do futuro do reinado
era manipulada pela feiticeira

e logo após algumas tentativas
a magia do bosque vingou
não restaram pessoas vivas
somente a princesa escapou

passaram dezesseis anos
a princesa assumiu-se rainha
sem seu povo reinava sozinha
aos desígnios dos arcanos

de imediato ela teve a visão
de uma deusa e seu manto
que prometia quebrar o encanto
se a princesa beijasse o chão

e a princesa assim o fez
toda terra envolveu-a ao colo
o encanto quebrou-se de vez
quando os lábios tocaram o solo

o céu recobrou o azul
a aldeia tornou-se cidade
fez-se recanto de felicidade
pela linda Princesa do Sul

quando sonhar eu quero
viajo para aquela aldeia
e sentado na praia eu espero
a princesa beijar lua cheia.

Wasil Sacharuk

Um milagre em minhas mãos

Eu danço sobre o farol, na melodia tristonha de um rouxinol,
e sobre a luz efervescente da lua.
Enquanto os homens dormem e suas estrelas bailam na aurora escura.
Eu teço um milagre em minhas mãos e pode ser o último.
Enquanto as bombas caem em meu arado.
Uma chama apagada pela escuridão,
Como será rosto da nação esquecida pelo seu povo?
Lamentando pela o dia da independência bravamente solitários.
Quando choramos ainda orgulhosamente de pé?
Quando orgulhosamente caímos de joelhos.

Seremos simbolicamente lembrados um dia?
Quando aqueles que entregarão suas vidas tiverem o devido respeito.
Quando homens condenados deixarem de legislar contra os juízes que os condenam.
Quando o silêncio cortante não mais for reprimido de gritar.
Quando Alegremente um pássaro despontar no raiar do sol livremente.
Então estaremos orgulhosamente honestos e bravamente humilhados
Podendo ou não bater a mão sobre o peito sem qualquer despedida.
Pois somos eternamente gratos por terem nos colonizados.

E estávamos dispostos a esquecer  todo o sangue que corre em nossas veias,
E todo o resto que foi derramado, pois teremos mais uma chance de provarmos
que somos durões com nossos rifles em nossas mãos marchando em frente a cavalaria.
Quando tudo que é claro se tornar escuro, como tudo que é calmo se atormentará.
Damos uma volta, bebemos uma,
Damos um abraço e apertamos as mãos e nos tornamos amigos novamente.
Voltamos felizes para nossas casas mortos ou vivos.

Talvez eles jamais se lembrem,
das grandes nações que se curvaram antes que o galo pudesse cantar.
Dos grandes líderes que fracassaram, dos Reis que voaram como penas,
Dez ou dose milhões de soldados e crianças rolando para fornalha ardente.
Debaixo de uma tempestade que uivava a cada amanhecer.
E eles aguentaram firmemente com uma voz que rugia como trovões em seus ouvidos.
Eu escreverei sobre as lápides do seu império, apagarei seu passos por onde quer que andem.
Quando o tolo e o cego perguntarem pela liberdade,
Quando o Índio e o sábio exclamarem pela liberdade,
Quando o pastor protestante clamar selvagemente por dignidade,
Então respondam ao chamado de seus corações, vivos ou mortos lutando.




Arte nos olhos

Eu e a estátua do Poeta Patativa do Assaré (Assaré, 5/3/1909 — Assaré, 8/7/2002)

Engatinho na escrita e na arte, feito criança sapeca, levada; vou de encontro ao bolo ou a bola, entro de sola; mergulho no sonho, totalmente cego e sem ego, sem pretensão de ser nada.

Arte nos olhos
(9/10/12)

Arte que brinca com a bola naquela velha praça,
Bermudas rasgadas, pés sujos e mente limpa.

Vento que sopra quente na respiração ofegante,
No belo guache que brilha.

Arte que vai a fundo à aventura,
Velho barco em velhas águas inóspitas...
Meio tombado, marrom e pôr do sol,
No óleo sobre tela banal.

Arte que imita um deus,
Imagem inebriante de dimensões erradas...
Casas pequenas, homens gigantes,
Na arte Naif com acrílica.

Arte que joga os dados,
Corriqueira, que dá o ar e o tira...
Que sustenta um corpo pagão,
Pastel seco ou carvão,
Na aquarela da vida.

André Anlub®

Espírito domado

Espírito domado



Não acredito em ilusão
mas faço minha realidade
não alimento a discussão
ainda que perceba a maldade

e que me venham os clichês...


não acredito em liberdade
quando o que sinto aprisiona
esta história de saudade
sofrimento
não me causa insônia

não me restaram lamentos
e pouco importam... os clichês...

não acredito em harmonia
uso as mesmas palavras
sem nenhuma ironia
sentida ou não, sem farpas

acabaram-se as aspas

e que outros venham... se quiserem
clichês sedentos deste universo
onde me rasgo, me esfrego

sei onde mora a magia
escondida numa floresta
já vi nascer poesia
num regaço iluminado por pedras

onde me espalho, me acho
espírito domado
livre no espaço
me faço... eco, som... mormaço.



Dhenova
20/04/2014

sábado, 19 de abril de 2014

SUZANA

Lembro Suzana,
Que tocava piano nas tardes
E tinha um olhar inocente
E tão cheio de ânsia e querer.

Tinha o sol morno,
Que transpunha as janelas de vidro,
Rebrilhava no piso da sala,
E Suzana, embevecida, tocava.

Tinha o namoro,
E Suzana abraçava seu moço
E falava de tantos anseios,
Misturando projeto e quimera.

Tinha a noitinha,
E Suzana se enchia de estrelas,
Invocava lirismos noturnos
E dormia na paz dos arcanjos.

Voaram os anos,
E Suzana ficou no passado,
É figura desbotada na mente,
Poesia perdida no tempo.

Barão da Mata

Whisky na sala



Whisky na sala

Tu que assopras assim
bafo frio em minhas barbas
e falas aquilo que exalas

Tu fazes rodamoinhos
nos meus pensamentos
nas minhas rimas de vento
e não deixas o meu poema
morrer sozinho
em lamentos

Tu que assopras em mim
teu verso em rebento
me esperas com whisky na sala

Escreveremos um movimento
dó sustenido em uníssono
que não cala
renitente como sinos
e provocante
como o discernimento

A ti eu queria
sem constrangimento
deixar uns versos pequeninos
que sirvam de monumento
da minha redenção à poesia
no nosso universo perto e distante.

Wasil Sacharuk

Ah, estes silêncios...



Ah, estes silêncios...

Eu queria entender como funcionam estes mecanismos, como gira aquela engrenagem, como o tempo se faz desatino, ele arde, como tudo acontece, mas não sei... ah, eu queria entender este silêncio, queria ser o sol, mar e o vento, só pra tentar ser, mas ser mesmo, não só estar... hoje meu amor foi embora... silêncio, silêncio - diz a voz do coração, cala-te noção. E volto às questões básicas, como funcionam os mecanismos, e todo este vício? O quê fazer? Eu procuro a palavra não dita (silêncio), aquela que a tua boca não pronunciou, mas sei que teu íntimo escutou, e fico pensando em quanto isso vai durar. Não, não me desespero, busco a razão. Roubei o silêncio pra mim, me fiz em tantas partes que nunca mais vais encontrar, plantei algumas num jardim, mas não embaixo das rosas, as outras, espalhei no horizonte... em silêncio, vou embora, deixo-te em paz... embora continue pensando nos tais mecanismos daquela engrenagem, e em como tudo funciona... bobagem.

Dhenova

As Cortinas

As Cortinas


O tecido transparente move-se com a pouca brisa vinda da janela de madeira, o movimento faz o atrito entre a parede e a mesa da televisão... que está fora do ar. Na janela, o vidro quadrado cobre metade da minúscula parede da sala e está meio aberto, o que faz as cortinas quase brancas lamberem o tapete ralinho verde. Na mesa de centro, um pato guarda moedas e alguns envelopes. No sofá florido, uma almofada de coração serve de encosto para uma mulher de cabelos presos e brancos, de óculos de grossas lentes, de olhos parados, e lábios roxos. Ela não respira.

Dhenova

FRIA MANHÃ...




Delicadamente abriu as janelas diante da manhã fria. Não era primavera, mas podia ver as acácias rosas, enfeitando pérgulas alvas.
O sol dourava-lhe o corpo timidamente e tingia-lhe a alma tão fria quanto a própria manhã.
Porém, Marazade era princesa dos seus imaginários castelos. Ela era a voz e o coração que rabiscavam histórias. Ela era a mulher que partia ao INFINITO para tecer aventuras para o seu Rei.

Malu Silva